segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008
Impulsos não são estratégia cultural
Quando falamos de nós e das nossas coisas tendemos a ser grandes. Não raras vezes, perdemos o sentido da realidade e falamos como de um sonho. O exemplo mais vulgar que encontro para mostrar esta ideia é a relação dos portugueses com a sua selecção de futebol. Muitas vezes tem sido apregoada por adeptos, comentadores, jornalistas, se não a melhor, pelo menos, uma das melhores selecções do mundo. A selecção portuguesa já tem feito história, na exacta medida de um pequeno país, mas na verdade nunca ganhou nada que lhe possa dar um estatuto de verdadeiramente grande. Sobretudo grande com perseverança e não só de pequenos impulsos.
No campo da cultura portuguesa acontece algo semelhante. Empolgamos em demasia o que é nosso e tomamos os pequenos impulsos como grandes coisas. Sejam esses impulsos um monumento perdido no meio do território, um escritor que conseguiu notoriedade internacional, um músico que toca em palcos reconhecidos, um pintor que expõe em Nova Iorque… No entanto, quando saímos de portas e ganhamos referências para comparação, verificamos que o nosso não passa mesmo de impulso. Tomarmos, constantemente, como grande o que são impulsos momentâneos, não ajuda a levarmos a sério o caminho que o país deve percorrer para começar o que, na verdade, nunca foi feito pela cultura em Portugal. É difícil encontrar em Portugal uma estratégia cultural para o país. Uma estratégia que se torne visível como a dos aglomerados de construções nas cidades. Uma estratégia capaz de articular as diferentes dimensões do ser humano e que seja para este o que as auto-estradas foram para as regiões do país.
Acreditem, nem é preciso mais dinheiro, mas mais articulação, coordenação e aproveitamento dos recursos existentes.
Permitam-me, aqui, um último parágrafo para sublinhar o muito que as Faculdades de Humanidades poderão desenvolver no campo da cultura e, concretamente, no trabalho de articulação e coordenação. Penso que se tem perdido excessivo tempo a apregoar a falta de alunos nestas áreas, como se dependesse da existência de alunos a necessidade destas Faculdades para um país. A necessidade das Faculdades de Humanidades justifica-se plenamente pelo tipo de revolução que se espera sempre delas: a revolução do próprio espírito humano. Para isso é preciso o atrevimento de se misturarem mais com o meio envolvente. No meu entender, um bom caminho para isso é levarem as preocupações com o deficit cultural do país a sério e tomarem-no como estratégia perseverante. Creio que passará por aqui o caminho para deixarmos cada vez mais de ser apenas impulsos, no que respeita à estratégia da política de cultura em Portugal.
Texto de José António Alves, Mestre em Filosofia.
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